Tamara Lorenzoni, mestre em Gestão de Marcas de Luxo pela Domus Academy Milano

Geração alpha e o futuro do consumo de luxo

Para essa geração, edições limitadas, recomendações sob medida e experiências omnichannel fluidas não são luxo, mas padrão mínimo de atendimento

Autora: Tamara Lorenzoni

A Geração Alpha, formada por crianças nascidas a partir de 2010, começa a se firmar como a próxima grande potência do consumo de luxo. Estimativas apontam que, até 2030, Millennials, Geração Z e Alpha responderão por cerca de 80% das compras globais do setor. Dentro desse cenário, o gasto combinado de Z e Alpha deve crescer três vezes mais rápido que o das gerações anteriores, alcançando um terço do mercado total (Business Insider, 2025). Esse salto reflete um comportamento inédito: desde cedo, muitos jovens já convivem com marcas e produtos premium, e não são poucos os que possuem artigos de luxo antes mesmo de completar 10 anos — enxergando neles não apenas objetos, mas expressões de identidade.

No Brasil, esse movimento acompanha o aquecimento do mercado local. O país já figura entre os 10 que mais crescem no setor de luxo e responde, junto com o México, por cerca de 25% do consumo latino-americano (Euromonitor International, 2024). Embora Millennials e Z sejam hoje os principais motores dessa expansão, a Alpha promete seguir o mesmo caminho conforme amadurece economicamente. A recuperação da renda entre consumidores de alta faixa e a ascensão dos jovens sustentam a expectativa de um avanço de 22% no mercado de luxo brasileiro nos próximos cinco anos (Investe SP, 2025). Ainda que não possuam renda própria, crianças e adolescentes já exercem influência em 88% dos lares do país, opinando sobre compras que vão de restaurantes a automóveis — um sinal claro de que ignorar esse público é abrir mão de relevância futura.

Onde a geração Alpha deve gastar

Ao atingir a vida adulta, os Alphas devem distribuir seus gastos em diferentes categorias, mas com padrões distintos dos que moldaram o consumo no passado. Moda e acessórios seguirão relevantes, porém menos vinculados ao logotipo e mais a valores como técnica, qualidade e funcionalidade. Eles crescem em um cenário pós-streetwear, marcado por fluidez de gênero e menos rigidez em dress codes (Business Insider, 2025). Desejam exclusividade por meio de customização — roupas, tênis e bolsas projetados sob medida, viabilizados por impressão 3D e algoritmos de recomendação. Para eles, luxo será tanto identidade pessoal quanto status.

Na beleza e no bem-estar, o apelo já é visível. O fenômeno das “Sephora kids” ilustra como crianças experimentam rotinas de skincare com marcas premium (Mintel, 2025). Quando adultos, devem se tornar consumidores fiéis de produtos de alta performance, mas com expectativas diferentes: marcas que priorizem saúde, autoestima, diversidade e autenticidade. Ferramentas digitais, como provadores virtuais e consultores de beleza baseados em IA, deixarão de ser inovação e passarão a ser requisito básico.

Viagens, hospitalidade e experiências ocuparão papel central no estilo de vida de luxo da Alpha. A preferência por vivências em vez de bens materiais, já presente entre Millennials, tende a se intensificar. Resorts, gastronomia de alto padrão e entretenimento exclusivo devem disputar orçamento com bolsas e relógios. No Brasil, 53% dos consumidores de alta renda já declaram intenção de aumentar gastos com experiências (Investe SP, 2025), um indicativo de que essa mentalidade se consolidará entre os jovens. Curiosamente, mesmo hiperconectados, muitos Alphas preferem interações presenciais a telas, o que sugere que buscarão no luxo a autenticidade que falta no digital.

A tecnologia será outra frente de consumo natural. Como nativos digitais, tratarão gadgets de ponta como parte do luxo cotidiano — de smartphones premium a casas inteligentes. Além disso, devem ampliar a relevância dos bens virtuais: skins exclusivas, NFTs e moda digital fazem parte de um consumo aspiracional sem fronteiras entre o físico e o virtual. Para eles, comprar em loja ou via celular será apenas dois momentos de uma mesma jornada omnichannel.

Até mesmo automóveis e mobilidade de luxo devem seguir no radar. Ainda que imaginem um futuro de transportes alternativos, carros de luxo continuarão sendo objeto de desejo — agora associados à inovação tecnológica e à sustentabilidade. Personalização e propósito ambiental devem ser atributos centrais para conquistar essa geração.

Valores que guiam a Alpha

Mais do que onde gastar, importa compreender como e por que os Alphas consumirão. Cresceram em meio a informação abundante e tecnologia intuitiva, o que moldou expectativas elevadas de conveniência e personalização. Para eles, edições limitadas, recomendações sob medida e experiências omnichannel fluidas não são luxo, mas padrão mínimo de atendimento.

Criados sob influência de pais Millennials, trazem forte consciência financeira e socioambiental. Pesquisas indicam que 70% priorizam causas e experiências a preço (Meio & Mensagem, 2025). Isso significa que pagarão mais por marcas transparentes, éticas e com propósito, rejeitando discursos incoerentes ou práticas de greenwashing. Também são naturalmente diversos: não enxergam pluralidade como pauta, mas como normalidade. Marcas que não refletirem isso — em produtos ou comunicação — terão dificuldade em conquistar sua lealdade.

No relacionamento com as marcas, esperam diálogo e co-criação. Não querem apenas comprar, mas participar: testar, opinar e ver suas contribuições incorporadas. Ao mesmo tempo, herdaram da Gen Z um ceticismo crítico em relação à propaganda, valorizando coerência e consistência em todas as plataformas. Conquistar um Alpha será menos sobre vender um produto e mais sobre construir comunidade, pertencimento e propósito compartilhado.

O impacto no Brasil e no mundo

Consultorias como Bain & Company estimam que o mercado global de luxo alcance 500 milhões de consumidores até 2030, com faturamento próximo a US$ 1,7 trilhão (Business Insider, Investe SP). Nesse contexto, Z e Alpha terão papel decisivo, crescendo três vezes mais rápido que as demais gerações. No Brasil, as projeções são igualmente otimistas: alta de 7% em 2025 e 22% acumulados até 2029, impulsionados pelo poder de compra jovem e pela digitalização. O e-commerce de luxo pessoal no país já cresceu 261% entre 2019 e 2024, tendência que será naturalizada por consumidores 100% digitais como a Alpha.

Como as marcas devem se preparar

Para empreendedores e players do luxo, a mensagem é clara: preparar-se para a Geração Alpha não é especulação, mas estratégia. Isso envolve:

  • Hiperpersonalização como norma, sustentada por IA e AR.
  • Propósito, sustentabilidade e transparência como pilares não negociáveis.
  • Diversidade e inclusão como parte do produto e da narrativa.
  • Experiências e comunidade como diferenciais de marca.
  • Influenciadores legítimos e vozes autênticas, próximos ao universo da Alpha.
  • Omnicanalidade e agilidade, com integração fluida entre físico e digital.
  • Qualidade e inovação constante, combinando tradição com vanguarda.

Tamara Lorenzoni é mestre em gestão de marcas de luxo pela Domus Academy Milano.

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